Já tem um tempo, um de nossos leitores (e não me lembro quem) nos pediu para que escrevêssemos algo sobre os marinheiros. Eu fui dando um procurada na internet, mas realmente encontrei pouca coisa a respeito dessa linha que, particularmente, eu adoro. Então tentei fazer o que costumo nessas horas de dúvidas: perguntar para quem melhor pode saber; o próprio guia.
Sentei na minha cama e me interiorizei para isso. Procurei o contato com meu amigo de toda a hora, com o marinheiro que me acompanha e comecei a fazer as questões. Ele, com sua paciência e jeito fanfarrão característicos, começou a me explicar.
Na verdade não tenho muito o que falar a respeito disso. Não que a linha não seja complexa ou cheia de mistérios e que tais mas, na verdade, essa é a grande graça: Eles são simples. Não simples como os boiadeiros, uma simplicidade pessoal, mas simples na maneira de trabalho: Os marinheiros são trabalhadores do elemento água, ou seja, são mestres da transmutação dos sentimentos, tal qual seus pares e parceiros de trabalho, os elementais da água.
Os marinheiros são tão próximos a esses parceiros, tão próximos ao elemento, que sua própria caracterização traz o balanço das águas junto. Claro,nós costumamos dizer que estão bêbados, faz parte do mito, e eles o alimentam porque assim, com essa caracterização, até seus médiuns ficam mais a mercê da transmutação que eles praticam: Estar bêbado quer dizer, quase sempre, estar feliz, alegre, esquecer dos problemas por alguns momentos, esquecer da dureza da vida e simplesmente se divertir. E isso é muito próximo a linha das crianças da Umbanda, que com sua inocência característica, gostam de nos mostrar que o problema é sempre menor do que gostaríamos que fosse. Quando o marinheiro vem e começa a balançar, até que está de fora, na assistência, parece sentir o balanço, olha para o campo santo e vê aquele monte de médiuns se segurando para não cair, fazendo aquela cara de safado que derramou a última gota da garrafa e, por incrível que pareça, acaba se deixando levar pelo balanço também, pela graça da situação. Quantas vezes eu já olhei pra assistência e vi todos gargalhando gostosamente enquanto os médiuns estão, simplesmente, começando a dar vazão aos seus guias? É essa a força do marinheiro, tão forte que nem precisa da proximidade pra se fazer presente, tão forte como as ondas do mar que, não importa o que encontrem pela frente, continuam seguindo seu caminho, limpando tudo o que encontrar, absorvendo os sais minerais das rochas mais duras para que todos seus moradores possam se alimentar e despejando de volta tudo o que não lhe interessa.
Quanto ao resto, é somente o resto. Existem várias coisas que vão me perguntar por causa deste texto, coisas de menor importância: como o marinheiro incorpora, se ele fuma cigarro, charuto ou cachimbo, se bebe cachaça ou vinho, se usa boina ou boné. Tudo isso tanto faz. Em um outro texto mesmo o João Marinheiro, amigo meu de longa data, já disse que tanto faz. Já disse que eles podem ser caboclos, exus, crianças, vôs, baianos, índios, chineses, brancos, amarelos, vermelhos, negros, velhos ou novos, tanto faz. Para eles o que importa e vir e fazer a festa para que nós possamos ficar melhores. Tanto faz se usa cigarro, charuto, se bebe isso ou aquilo, isso são só ferramentas, o que importa é o objetivo, não o caminho para alcançá-lo. O resto, portanto, fica muito mais por nossa conta que por causa deles.
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Sabe moço, é raro quando eu apareço por aqui. Tão raro que quase sou esquecido. Não me importo, eu amo todos vocês mesmo assim.
Moço, é divertido, para mim, estar entre vocês. É sempre um festejo, sempre um gracejo.
Moço, é divertido, para mim, estar entre vocês. É sempre um festejo, sempre um gracejo.
“Marinheiro, que é marinheiro,
Tem que ser namorador,
Tem que ser namorador,
Em cada cais uma namorada,
Em cada porto um amor.”*
Tem que ser namorador,
Tem que ser namorador,
Em cada cais uma namorada,
Em cada porto um amor.”*
Para mim é assim, já que nem pescador eu sou. Minha praia é outra, eu fico ali, entre a areia e o mar. Muita gente acha que sou bêbado, às vezes me dão bebidas e eu faço graça, afinal, sei que é de coração. Mas meu balanço não vem do álcool, vem do elemento ao qual me acostumei. Oras, não dizem que sou aliado do sentimento? Sou aliado das águas, quase água pura, e quem já viu água ficar parada? Só vocês, encarnados, é que fazem isso, aprisionam o elemento da vida e a obrigam a renegar sua própria natureza, o movimento, a maré, o seguir a lua, apaixonante lá no cosmo. Quando me uno a você, irmão, tento te lembrar de como era antes de ser tomado pela aridez do mundo, mesmo no útero materno você também balançava. Tento te levar para o meu mundo, meu elemento, onde nada é estático, nada é vazio, nada é duro, e tudo pulsa com a vida. Quando me aproximo, trago comigo miríades de elementais, seres de puro sentimento de amor e felicidade, que inundam seu corpo denso e o mergulham na maré de nossas águas.
Às vezes somos crianças, às vezes somos unidos a outras energias, às vezes direita, às vezes esquerda, depende da maré, às vezes nos disfarçamos, às vezes nos fingimos de sérios, às vezes de bravos, às vezes de desentendidos. Às vezes vimos pelo vento nas velas de nossas caravelas, às vezes pelos braços nos remos, às vezes trazemos a sabedoria do velho pescador, às vezes do jovem capitão de nau. Às vezes negros, às vezes caboclos, às vezes brancos, espanhóis, portugueses, brasileiros, chineses, não importa como faremos para que nos identifique, para que nos acredite, porque por mais que você não se lembre, sempre estaremos lá.
Às vezes somos crianças, às vezes somos unidos a outras energias, às vezes direita, às vezes esquerda, depende da maré, às vezes nos disfarçamos, às vezes nos fingimos de sérios, às vezes de bravos, às vezes de desentendidos. Às vezes vimos pelo vento nas velas de nossas caravelas, às vezes pelos braços nos remos, às vezes trazemos a sabedoria do velho pescador, às vezes do jovem capitão de nau. Às vezes negros, às vezes caboclos, às vezes brancos, espanhóis, portugueses, brasileiros, chineses, não importa como faremos para que nos identifique, para que nos acredite, porque por mais que você não se lembre, sempre estaremos lá.
Seu João Marinheiro.
* O ponto correto é
“Marinheiro, que é marinheiro,
Tem que ser bom pescador,
Tem que ser namorador,
Em cada cais uma namorada,
Em cada porto um amor.”’
“Marinheiro, que é marinheiro,
Tem que ser bom pescador,
Tem que ser namorador,
Em cada cais uma namorada,
Em cada porto um amor.”’
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A Vida é Pra Beber Seu Moço!
Sabe moço, tem vezes que nós ficamos com os nervos a flor da pele. Tudo o que pensamos é ruim, pouca coisa nos agrada e nossa vontade é de descontar no mundo todo. É normal, até nós aqui, do outro lado, temos dias assim. Até o mar tem suas ressacas, os dias ruins, em que nenhum pescador se atreve a jogar suas redes, a içar a bujarrona ou ligar seu motor. Eles sabem entender os humores do grande mar, da mãe d’água. E sabem que se esperarem, logo a turbulência passa e a vida continua.
Na vida, seu moço, é assim também: agente tem que saber esperar o tempo certo das coisas. Mas esperar não quer dizer morrer, nem deixar a vida passar, não é isso não! A vida é como uma garrafa, uma vez aberta, tem ser consumida. Vai de você engolir tudo e ficar bêbado, ou tomar aos poucos e apreciar o sabor da bebida, com parcimônia e sem exageros. Como a bebida, se fizermos do primeiro jeito, a vida pode ser boa no começo, mas depois vai dar uma dor de cabeça…
Na vida, seu moço, é assim também: agente tem que saber esperar o tempo certo das coisas. Mas esperar não quer dizer morrer, nem deixar a vida passar, não é isso não! A vida é como uma garrafa, uma vez aberta, tem ser consumida. Vai de você engolir tudo e ficar bêbado, ou tomar aos poucos e apreciar o sabor da bebida, com parcimônia e sem exageros. Como a bebida, se fizermos do primeiro jeito, a vida pode ser boa no começo, mas depois vai dar uma dor de cabeça…
No mar o barco vem,
No mar o barco vai.
No barco o moço segura,
Senão cambaleia e cai!
Seu João Marinheiro, 20 de agosto de 2008No mar o barco vai.
No barco o moço segura,
Senão cambaleia e cai!
Escrito por Nino Denani
Postado no Grupo de Estudos Boiadeiro Rei
Mensagem linda e de grande esclarecimento..... transparente feito água,simples como a vida....simples como as marés....simples como
ResponderExcluiros marinheiros queridos, que tanta ajuda nos dá.
Simples assim......
Saravá a falange dos marinheiros!!!!!!!