Junto com essa paisagem, centenas de carros na avenida, centenas e mais centenas de pessoas indo e vindo, indo e vindo trabalhar, indo e vindo do hospital, indo e vindo estudar, namorar, passear… Enfim, centenas e mais centenas de pessoas se movimentando, lutando e se emocionando.
É, a nossa oração de hoje não pode ser para outro Orixá. Somente Ela tem condições de nos sustentar nesses momentos de nossa vida. Somente Ela, IANSÃ, a Orixá do tempo, do vento, da paixão, do movimento, da busca, da guerra, da crença, da intensidade, da verdade a qualquer custo, da auto-estima, do fogo, da chuva, do Sol, da Lua, do raio e da terra para amparar, apoiar, suprir, defender, salvar seus filhos ainda tão indefesos, imaturos e pequenos diante de Tudo e Todos. Ufa…
Realmente, para falar de Iansã precisamos respirar fundo, precisamos ser rápidos e intensos em todos os extremos.
Iansã é uma mulher guerreira, batalhadora e que menstrua, é mulher do século XXI, que sabe o que quer e vai à luta.
É a mulher que acorda de manhã, beija os filhos e sai em busca do sustento.
Que mostra o seu amor e a sua alegria contagiantes na mesma proporção que exterioriza a sua raiva e o seu ódio.
É inconformada e inquieta, está voltada para o impulso de realizar coisas.
Iansã me faz lembrar de “Gabriela” a personagem principal do livro Gabriela, Cravo e Canela (1958), de Jorge Amado que chega a Ilhéus com um grupo de retirantes, suja e maltrapilha, mas depois de um banho revela-se irresistível e poderosa, vestindo-se como quer, usa seus dotes culinários e sexuais para atrair ofertas dos homens da cidade, mas quando lhe dá na cabeça, tira os sapatos, joga-os para o ar e sai brincando com as crianças da rua, feliz porque o sol bate na sua pele e porque está rodando, rodando…
É a tempestade o grande poder manifesto de Iansã, rainha dos raios e das ventanias, que tem o Afefe, o vento, como seu mensageiro. Dança sobre brasas com suas espadas, eruxin e chifres, duela vigorosamente e sinuosamente, ora amorosa ora raivosa.
É a única capaz de enfrentar e dominar os Egunguns.
Foi paixão de Ogum, Oxaguian, Exu. Conviveu e seduziu Oxóssi, Logun-Edé e tentou, em vão, relacionar-se com Obaluaiê. Mas, ao chegar ao reino do deus do trovão, Iansã aprendeu muito… Aprendeu a amar verdadeiramente e com uma paixão violenta, pois Xangô dividiu com ela os poderes do raio e deu a ela o seu coração.
E antes que vocês leiam a oração, não posso deixar de compartilhar esse momento que só vem reafirmar que coincidências não existem. Vejam que encantador e provocante (- como são as “coisas” de Iansã): enquanto escrevia esse texto recebi um e-mail com essa linda e inspiradora poesia de Elisa Lucinda que, para aqueles que conseguirem ler comolhar de poeta, alcançarão a essência e a beleza de ser mulher, de ser mulher que menstrua, de ser Filha de Iansã.
Boa leitura a todos e que Iansã possa movimentar nossa vida e nossas emoções, levando-nos para bem perto do céu.
Aviso da Lua que menstrua
De Elisa Lucinda
Moço, cuidado com ela!
Há que se ter cautela com esta gente que menstrua…
Imagine uma cachoeira às avessas:
cada ato que faz, o corpo confessa.
Cuidado, moço
às vezes parece erva, parece hera
cuidado com essa gente que gera
essa gente que se metamorfoseia
metade legível, metade sereia.
Barriga cresce, explode humanidades
e ainda volta pro lugar que é o mesmo lugar
mas é outro lugar, aí é que está:
cada palavra dita, antes de dizer, homem, reflita.
Sua boca maldita não sabe que cada palavra é ingrediente
que vai cair no mesmo planeta panela.
Cuidado com cada letra que manda pra ela!
Tá acostumada a viver por dentro,
transforma fato em elemento
a tudo refoga, ferve, frita
ainda sangra tudo no próximo mês.
Cuidado moço, quando cê pensa que escapou
é que chegou a sua vez!
Porque sou muito sua amiga
é que tô falando na “vera”
conheço cada uma, além de ser uma delas.
Você que saiu da fresta dela
delicada força quando voltar a ela.
Não vá sem ser convidado
ou sem os devidos cortejos.
Às vezes pela ponte de um beijo
já se alcança a “cidade secreta”
a Atlântida perdida.
Outras vezes várias metidas e mais se afasta dela.
Cuidado, moço, por você ter uma cobra entre as pernas
cai na condição de ser displicente
diante da própria serpente
Ela é uma cobra de avental
Não despreze a meditação doméstica
É da poeira do cotidiano
que a mulher extrai filosofando
cozinhando, costurando e você chega com a mão no bolso
julgando a arte do almoço: Eca!…
Você que não sabe onde está sua cueca?
Ah, meu cão desejado
tão preocupado em rosnar, ladrar e latir
então esquece de morder devagar
esquece de saber curtir, dividir.
E aí quando quer agredir
chama de vaca e galinha.
São duas dignas vizinhas do mundo daqui!
O que você tem pra falar de vaca?
O que você tem eu vou dizer e não se queixe:
VACA é sua mãe. De leite.
Vaca e galinha…
ora, não ofende. Enaltece, elogia:
comparando rainha com rainha
óvulo, ovo e leite
pensando que está agredindo
que tá falando palavrão imundo.
Tá, não, homem.
Tá citando o princípio do mundo!
-
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ORAÇÃO A IANSÃ
Iansã, mãe e senhora dos ventos e tempestades, das horas aflitas e das almas perdidas.
Dona de todas as direções.
Operosa divindade em prol dos desígnios dos filhos caídos sem norte e vontade.
Piedade para nós, criaturas que vivemos à beira das tentações, dos abismos, alheios ao amor do pai Olorum.
Mãe, empresta-nos tua decisão e tua coragem, para o encontro do nosso próprio ser.
Coloco em tuas mãos minhas ações, na luz de tua luz, eu te consagro todos os minutos e horas desse dia, meus trabalhos, minhas preocupações, meus anseios e meus lazeres são teus.
Dai-me hoje a tua luz poderosa, para que eu compreenda todo bem que preciso fazer e tenha força para não ceder ao mal que tenta bater em minha porta.
Que eu consiga ser mais fraterno, mais irmão, mais compreensivo e capaz de perdoar.
Dai-nos um roteiro de esperança e triunfo.
Erradicai a pobreza dos nossos sentimentos, orienta-nos para a verdade dentro do caminho de devoção ao Supremo doador.
Encoraja-nos, Senhora dos Raios, para que nossa própria mente, siga uma só direção: amar a Olorum.
Êparrei Yansã!
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