Saravá seu Zé Pelintra, moço do chapéu virado
Na direita ele é maneiro, na esquerda ele é pesado
Cuidado, meu camarada, não meta a mão na cumbuca
Quem mexer com Zé Pelintra vai ficar lelé da cuca
Sou filho de Zé Pelintra, tenho que me orgulhar
Pra me livrar da mandinga carrego meu patuá
A Casa de Candomblé Ketu Obá Tundegi, lá no Parque das Laranjeiras, em frente ao conjunto São Judas Tadeu, estava preparada com rosas, tapete vermelho, perfumes, defumações e tudo o mais necessário para uma festa de caboco, a festa do malandro curandeiro: Seu Zé Pelintra, de Mãe Graça de Xangô.
Ao batuque ritmado dos ogans, logo baixou Seu Zé Pelintra, que recebeu de seus filhos e filhas um presente, como ele mesmo falou depois, o presente na forma como ele gostaria de receber, uma simples flor, mas com muita devoção e respeito pelo seu dia, o dia de sua festa.
Festeiro e conversador, como é, Seu Zé se apresentou e abençoou filhos, convidados, simpatizantes da religião, todos os presentes:
Passamos por momentos difíceis, por momentos alegres. Eu, Zé Pelintra, sou malandro, mas sou um grande espírito de luz. Peço a Oxalá, a Nosso Senhor do Bonfim, a Xangô, rei da casa, a senhora Oxum, que abençoe todas minhas filhos e todas minhas filhas, que lhes dê êxito, prosperidade para que eles cresçam e sejam grandes sacerdotes. Viva Deus!
E logo começaram a baixar muitos outros cabocos e cabocas, que vieram compartilhar da festa de Seu Zé Pelintra.
Ô Zé, quando vem das Alagoas
Toma cuidado com o balanço da canoa
Ô Zé, faça o que quiser, ô Zé
Só não maltrate o coração dessa mulher
De tão abençoada a festa, até baixou num determinado momento um caboco novo no terreiro (deitado ao chão na foto abaixo), que foi recebido por Seu Zé, que se prolongou na conversa e nas explicações com todos os presentes:
Esse caboco que baixou aqui agora é Noratinho, é um caboco que mora na cidade de Óbidos, lá ele tem a encantaria dele. É um espírito encantado no fundo do oceano. Noratinho já afundou vários navios. As pessoas fazem promessa pra ele e não cumprem, ele emborca. Todo mundo sabe que Noratinho, ele e Zé Pretinho do Amaral são encantados na porta do Humaicá, próximo a Óbidos, e são entidades que governam Manaus, pois eles governam Pará e Amazonas. Pará e Amazonas é dominado mais por mamãe Oxum, Boto Tucuxi, Cavalo Marinho, Boto Branco, Noratinho, Zé Pretinho do Amaral, Helena das Trevas, Nanã Bolucã, Bessen, Oxumaré, que vem transformado em cobra. Já no Rio, já é mais governado por Ogum; São Paulo, também governado por Ogum e Oxóssi; Bahia, governado pelos fundamentos das Áfricas; Ceará, pelos cangaceiros, pelos cabanos.
Claro que no Pará e Amazonas também teve cabanos, mas o lugar de mais cangaceiros foi no Ceará. Eu digo porque vim da África moleque, fui criado em Juazeiro do Norte, fui pro Rio de Janeiro, fui o primeiro, e meu nome não é Zé Pelintra. Zé Pelintra é meu nome de fantasia. Meu nome é José de Arimatéia. Procure ver a lenda de José de Arimatéia. Eu fui o primeiro negro formado advogado. Fui o primeiro negro a arrombar a senzala e salvar meu povo. Existe já um homem que escreveu que eu morri envenenado. Jamais eu morri envenenado, porque eu era louco pela minha vida. Eu morri assassinado na porta de um cabaré, porque eu amava minha mulher, mas eu era um cabra cachorro, sem-vergonha, malandro, vagabundo.
Na cabeça dessa filha que eu estou, com todo respeito, eu, se eu quiser escrever minha lenda verdadeira, eu sei que eu posso, porque eu não sou analfabeto. Eu sou filho de um africano, de um negro, nasci em senzala, eu sei o que é senzala, eu sei o que que é uma pessoa chegar e olhar os negros pelos dentes. Nego tinha de adulterar com dez, vinte mulher, como pai José, que sofreu muito, foi meu pai. Eu sou filho de Pai José, um preto velho. E minha mãe é Katarina. O resto eu não vou falar. Só tenho uma coisa a dizer: eu saí da África moleque, moleque que nem falava nem andava, a minha sorte é que tinha um coronel, e eu era inteligente, minha mãe foi a mucamba da mulher dele, e eu era quem lia pros filhos dele. Eu não precisei de professor, eu ajuntava as letras e fazia meus romances. Eu tocava violão. Olha!, você pode me dar um violão, a dona Graça não sabe porra nenhuma, mas eu toco o violão, faço minha ceresta.
Então, gente, eu respeito muito a mãe de santo que eu estou, eu amo a dona das Graças. A entidade, eu, Zé Pelintra, se um dia tiver num terreiro, e dizer que não ama dona das Graças, pode acreditar que é mentira, não é Zé Pelintra. Eu amo ela desde quando ela nasceu. Essa menina não tinha nem sete anos de idade, quando nós tomamos conta dela. A dona das Graças é filha de um homem muito rico, nós tiramos ela. Vocês algum dia já viram algum irmão da dona das Graças, vocês já viram algum parente da dona das Graças? Mas vocês sabem que ela tem muitos. Mas nós tiramos ela e botamos ela pra humildade. Dona das Graças é filha de um homem muito rico. É morto, mas tem nome. E quem criou ela tem nome também, que foi Dr. Pontes Neto, de Quixaramobim. E nós tiramos ela de todo mundo e deixamos ela sozinha…
Antes de se cantarem os parabéns ao Seu Zé Pelintra, algumas erês vieram para comer do bolo. Mas Seu Zé mandou as duas, Brinquinha de Obá e Princesinha de Oyá, subirem, pois queria na mesa apenas os médiuns. Registramos ainda a Brinquainha fazendo suas mesuras para os presentes (abaixo):
Finalmente os parabéns foram dados, a comida foi repartida entre todos os médiuns e Seu Zé Pelintra fez a oração, da qual deixamos aqui um trecho das sábias palavras do caboco malandro e curandeiro:
Agradeço a Deus Pai todo poderoso, pelo divino Espírito Santo, pelo Nosso Senhor do Bonfim. Que essa refeição seja de êxito e de prosperidade e um futuro de honra. Ô, divino Espírito Santo, eu, caboco Zé Pelintra, humildemente peço a Nosso Senhor do Bonfim, a senhor Xangô, a senhora Oxum, senhora Iansã e senhor Oxalá, abençoe estes filhos e todas estas pessoas. Viva Deus! Ageumã! Ageumã! Ageumã!
Eu deixo a nossa gira com Deus e Nossa Senhora
Eu deixo a nossa gira em salmoreta e pau-de-angola
Ô, quem vai lá pra tão longe, ô mamãe?
Sou Zé Pelintra, terminei de trabalhar
Ô, dai-me forças pelo amor de Deus, meu Pai
Ô, dai-me forças pros trabalhos meus
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